ISABEL MELO
Maria Isabel Direito Pintão Pereira Melo, é natural de Estremoz e considera-se também de Setúbal, para onde veio viver aos dez anos. Licenciada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa, Advogada, Professora na ESCE, Jurista, Consultora, Doutoranda em Direito na Universidade Complutense de Madrid.
É membro da Direção da Associação Casa da Poesia de Setúbal, ajudando a promover e divulgar essencialmente a obra de poetas e escritores setubalenses, mas também poetas de âmbito nacional, seja através de antologias, ou trazendo convidados para a Biblioteca e outros espaços da cidade, seja levando a poesia às escolas ou outras instituições locais, bem como através de eventos Solidários e Encontros Poéticos, sempre divulgando a Arrábida e o Sado em forma de poesia.
Ao longo dos anos tem participado em conferências várias, livros, bem como em revistas e jornais de âmbito local e regional, aliando sempre um pouco do seu conhecimento e saber às vertentes cívica, social e cultural.
POEMAS DE ISABEL MELO
Sede saciada
Por entre bosques e pensamentos
Não há sede que não seja saciada
Brotam fontes, afastam-se os medos
Fazem da alma essa serra encantada.
É tamanha a magnificência
Despertada pelos sentidos
Que não há flores, não há fauna
Que não se sintam acolhidos.
Rosas, árvores, lírios
Partilharam tal contemplação
Ginetas, aves, veados
Pausaram em leda mansidão.
O azul grande do Oceano
Com a Arrábida por sua sebe
Em amor farto de tamanho
Não há melhor para saciar a sede.
Arrábida de Mel
Serra de que todos os poetas gostam!
Agarram-se a ti
e percorrem a sua Musa!
Amam tuas flores, teus arbustos,
tuas aves, cheiros e cores.
Tropeçam nas tuas pedras soltas,
comem das tuas bagas,
avistam o rio e o mar,
absorvem teus néctares.
Amam e deixam-se amar,
tocar sua tez pelo sol,
pela brisa se deixam soprar.
De olhos semicerrados,
dão beijos com sabor a mel
e envoltos no fresco da maresia,
acordam no meio de um poema,
do livro da nossa Arrábida,
Arrábida da nossa poesia!
15/12/2017 Isabel Melo
Mais que disseram,
Cantaram a Arrábida!
Cantaram a Arrábida
Com seus pés,
Com seus versos,
Com suas mãos,
Com seus amores,
Com seus sonhos,
Com seus sentimentos,
Com seus sorrisos.
Tanto a cantaram
Que dela fizeram
Serra-Mãe!
Novos Tempos deste tempo
Para que sejamos nós próprios,
Em tempo tão estranho, este tempo dos tempos
Vou tentar apaziguar toda a torrente de sensações
Em força do vento vindo do Universo como centro
Para em fervor nos questionar e apaziguar com reflexões.
Palavras sobre um vírus desconhecido vieram de longe
Em sobressalto num tempo cada vez menos distante
Agonizaram seres que não tiveram tempo para a fuga
Dando a outros a estranha sensação de transmitir a culpa.
Para que sejamos Humanidade,
De forma cerimoniosa nos afastámos e a medo nos escondemos
O nosso temor se confirmou e surgiu em forma de pandemia
Confinamento e distância social se exigiu no próprio amor
E se pensou na Alegoria da Caverna com medo do próprio dia.
Cidades vazias em casas plenas de informação em suspenso
Com preces e ajuda dos profissionais de saúde em fixação
Com a ironia de estar a Humanidade num ecrã como argumento
De um tempo que nos questiona se é realidade ou ficção.
Para que façamos parte dos nossos,
Transformámos a dedicação e o amor na utilidade da união
Entendemos o torpor, avanços e recuos para a comunidade
Filhos e netos ajudaram pais e avós sem estigma de obrigação
Das varandas e vias digitais inventámos actos de solidariedade.
Em testes de matemática e ciência com silêncio em abundância
Tacteámos novos gestos para vidas carentes de abraços
Cantámos, escrevemos, dissemos, gritámos ecos de esperança
A fim de não esquecer que em Primavera continuamos nossos passos.
Isabel Melo
23/4/2020
Quem me dera ser uma ave
Quem me dera ser uma ave e apenas ver
O que pelo mundo fora apenas me apetecer
Não ver ecrãs aos tiros nem jornais de faixa preta
Sobrevoar montanhas, mares e cidades a resplandecer
Não ouvir relatos de pessoas que não sabem o bem querer
Subir acima da morte e tirar a paz de uma gaveta
Não ver desdéns entre mesquitas ou catedrais
Apenas lugares, pedras ou espaços de oração
Não ver gente do sim contra a sombra do não
Mas que entrem estes, os outros e todos os demais
Retirar do dicionário o refugiado e a discriminação
Ver a chuva de alimentos dar ao mundo a cartilagem
Que já forte, retira a fronteira e abre a outra margem
Para em grupos de gente se estender uma e outra mão
Não ver almas de gente com o meu ou o teu sobejo
Em que só as lágrimas amolecem a côdea da dor
Que anseiam por um sorriso para regar suas flores sem cor
E que sonham com batuques e alaúdes formando um cortejo
Não ver caminhantes pela senda da desgraça
A destruírem bolas e bonecas dos meninos
Apanharem os pombos que levam os sonhos de Aladino
E atirarem corvos para debicarem os restos da barcaça
Não mais ver nações e Parlamentos à volta do enigma
Ver poetas a cantar a justiça na balança do amor
Juízes a banir o mal e decidir a paz com furor
Ver raças, credos e gentes diferentes sem nenhum estigma.
Ah, quem me dera ser uma ave e apenas ver
O que pelo mundo fora apenas me apetecer.
Palmela, 28/04/16
Isabel Pintão Melo
Novos sinais
No planeta novos sinais
Nos fizeram sentir quem somos
Errantes, simples e frágeis
Descobrimos que somos humanos.
Era do imaginário
Na era da ingratidão
Novos tempos do calendário
Trouxe o vírus sem ficção.
28/04/2020