ARTIGOS
REGIÃO DE SETÚBAL E AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS
“Nas últimas semanas as notícias sobre catástrofes naturais um pouco por todo o planeta começaram a rivalizar com as notícias sobre a actual pandemia.
E a região de Setúbal? Qual a sua posição e resiliência em relação às Alterações Climáticas?”
ARRÁBIDA UM LUGAR DE ELEIÇÃO
“Ninguém sabe ao certo quem foi o autor do mundo em que vivemos: se Deus, se o acaso, ou outra forma ou força qualquer. Pouco importa, se a Arrábida foi criada e existe, e está, felizmente, muito para além de todas as incertezas, angústias e polémicas da criação.”
O PLANETA POR DETRÁS DO ESPELHO - 1ª PARTE
Olho a terra ressequida da minha janela, ela espreita por detrás do meu velho espelho, que me leva sempre a um mundo mágico, mas mesmo aí o meu coração não consegue evitar ouvir grito abafado do Planeta, cansado de tanto implorar que o ajudem.
O PLANETA POR DETRÁS DO ESPELHO
1ª PARTE
SÃO SALTEIRO
Olho a terra ressequida da minha janela, ela espreita por detrás do meu velho espelho, que me leva sempre a um mundo mágico, mas mesmo aí o meu coração não consegue evitar ouvir grito abafado do Planeta, cansado de tanto implorar que o ajudem.
Por isso, não resisto a falar sobre o tema do ambiente e da VIDA.
É verdade que nunca se falou tanto sobre o ambiente, sobre a necessidade de modificar rapidamente os nossos comportamentos perante a Terra Mãe, mas também é verdade que os valores das grandes economias se sobrepõem à necessidade de tomarmos medidas não apenas de fachada mas reais .
Lembro-me que quando era miúda e já lá vão mais de 50 anos, este tema, era alguma coisa que não nos preocupava muito.
Apenas nos anos 70, o assunto passou a ter impacto, nomeadamente, a ser levantado pela voz dos mais jovens. Claro que era visto como mais uma forma da rebeldia juvenil dos que queriam um planeta mais azul e menos poluído.
Era a busca de uma liberdade de expressão, haviam também razões que estavam ligadas aos grandes temas da devastação do planeta, Woodstock foi mais que foi “Uma Exposição “Aquariana de 3 Dias de Paz & Música”, era um grito para o fim das guerras que matavam sem sentido que queimavam as florestas virgens que aniquilavam culturas ancestrais desprezando todo o conhecimento da renovação da Terra Mãe onde só se tinha como preocupação roubar o ouro negro que iria dar uma nova forma de viver onde os espaços verdes, os rios azuis e céu transparente desaparece para dar lugar ao desenvolvimento económico sem tempo para a história do planeta e do respeito para os espaços feitos de luz natural da Terra Mãe.
Bom, mas não nos vamos perder pelos momentos que embora denominados de anos loucos, muitos eram os jovens sonhadores com um planeta mais azul e menos poluído e mais humanizado.
Assim, hoje deixo -vos com com um momento de reflexão:
1º – Estamos nós realmente sensibilizados para os desequilíbrios ambientais que se estão a fazer sentir cada vez maior equidade? Ou encolhemos os ombros e achamos que é apenas pura coincidência?
Volto de novo à sala, deixo para trás o meu espelho e a viagem mágica , mas a verdade é que não consigo deixar de sentir vergonha pela minha inércia porque no fundo eu continuo a ouvir o bater cansado do coração do planeta e da Terra que tanto amo.
Sim, vivo numa Cidade que tem uma Serra Verde, cantada por poetas e um rio azul que se confunde no horizonte com o firmamento.
E o que faço? De que forma tento despertar as gentes para perceber a necessidade urgente de se começar já a agir em prol deste nosso Planeta e desta minha Cidade única?
Nada!… Só o meu espelho me espera para mergulhar e encontrar no outro lado formas para despertar o interesse de salvar enquanto é tempo, porque o tempo também não pára e TODOS NÓS
teremos que correr contra o tempo e encontrar a resposta por detrás do espelho que cada um nós temos ainda!…
REGIÃO DE SETÚBAL E ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS
JOSÉ ALEX GANDUM
Foto: José Alex Gandum
Nas últimas semanas as notícias sobre catástrofes naturais um pouco por todo o planeta começaram a rivalizar com as notícias sobre a actual pandemia. De repente, regiões do Canadá onde por vezes até neva em Junho atingiram dos valores mais altos de temperaturas já registados na Terra, provocando milhares de vítimas. Depois a Europa central, nomeadamente a Alemanha, conheceu devastações impensáveis, logo seguida por uma região da China com cheias onde em três dias choveu o que chove habitualmente durante um ano. Mais recentemente, neve em grande parte do sul do Brasil. Paralelamente, fogos desde a Amazónia e Pantanal à Califórnia e à Austrália, com o absurdo de a Sibéria também estar a arder.
Apesar das ondas de calor que grassaram por quase toda a Europa durante várias semanas em Junho e Julho deste ano, Espanha incluída, Portugal escapou até agora a esse fenómeno. Até o incêndio de Monchique pode ser atribuído a incúria e não necessariamente às alterações de clima, porque os resíduos dos grandes incêndios de 2018 não foram recolhidos, com a agravante de arbustos e outra vegetação rasteira – principal combustível nos incêndios do sul de Portugal – terem crescido desmesuradamente com as chuvas do último Inverno, e poucos proprietários – Estado incluído – não cumprirem a legislação de limpeza dos terrenos.
E a região de Setúbal? Qual a sua posição e resiliência em relação às Alterações Climáticas? Na verdade não se prevê fenómenos na região idênticos aos que aconteceram no centro da Europa mas a região não está imune às ondas de calor, incêndios ou até inundações, em princípio de amplitude limitada, embora a baixa de Setúbal, o centro histórico do Seixal ou Corroios já tenham sido atingidos por cheias assinaláveis.
No tocante a ondas de calor, por exemplo, no ano passado a região de Alcácer-do-Sal registou os valores de temperatura do ar mais altos em Portugal, com uma permanência por vários dias de mais de 40 graus centígrados. O valor da precipitação do passado Inverno deu um contributo fundamental para manter o caudal do rio Sado, mas nos anos anteriores a percentagem de água na nascente do rio – causado pela fraca pluviosidade – chegou a ser muito preocupante.
A Península de Setúbal é uma das zonas mais sensíveis do país em termos de clima. A Serra da Arrábida – dona de vários microclimas – tem sido poupada a incêndios desde os fatídicos fogos de 2003 que dizimaram vegetação única a nível mundial, mas não há segurança que a Serra, ou alguns dos seus maciços, não sejam atingidos pelo fogo neste Verão que os especialistas dizem que vai ser dramático em muitas zonas do Globo. Por outro lado, a deficiente gestão dos recursos hídricos, em especial nos estuários dos rios Tejo e Sado pode contribuir para a alteração do clima. E é bom não esquecer que debaixo da Península vive o maior aquífero da Europa. Por tudo isto, e não só, é bom estarmos preparados para as Alterações Climáticas na região de Setúbal, e tudo fazermos que esteja ao nosso alcance para as mitigar, quer seja através de pequenos gestos, como reciclagem e redução do consumo, quer através da consciencialização ambiental.
ARRÁBIDA: UM LUGAR DE ELEIÇÃO
SALVADOR PERES
BIOGRAFIA:
Salvador Peres, nasceu em Setúbal, em 1954.
Formado em Filosofia e especialista em comunicação e relações públicas, desenvolveu, em Portugal (EDP e Fundação EDP) e em organismos internacionais cargos directivos ligados à energia e projectos de comunicação nas áreas do ambiente, da cultura e da imagem corporativa.
Ligado ao associativismo, exerceu funções de Presidente da Direcção da Academia de Música e Belas Artes Luísa Todi e de Vice-Presidente do Club Setubalense; actualmente, é Vice-Presidente da Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA).
Desenvolve, desde os anos 90 do século passado, actividades na área cultural na cidade de Setúbal. É fundador dos grupos musicais In Situ e e-Vox, no seio dos quais desenvolveu e continua a desenvolver (e-Vox) uma intensa actividade na área da composição musical e produção de concertos.
É membro fundador e coordenador do grupo Synapsis, um movimento de artistas, criadores e intelectuais, cujos membros partilham uma visão de intervenção cívica, sustentada nos valores da cidadania activa.
É autor de três livros: “A Vingança da Ferramenta” (1991), “O Armazém de Palavras” (2000) e “A Travessa dos Bispos Escarlates e Outras Histórias” (2012). E co-autor, em parceria com João Coelho, de um quarto livro: “Está alguém desse lado?” (2016).
Ninguém sabe ao certo quem foi o autor do mundo em que vivemos: se Deus, se o acaso, ou outra forma ou força qualquer. Pouco importa, se a Arrábida foi criada e existe, e está, felizmente, muito para além de todas as incertezas, angústias e polémicas da criação. A Arrábida está ali, ao alcance dos nossos sentidos.
Sou natural de Setúbal e habituei-me à presença da Serra da Arrábida como se ele fosse parte integrante de minha própria individualidade. Aquela forma inconfundível, que se casa com o Estuário do Sado na sua junção com o Atlântico, faz parte de um universo muito nosso. É um património colectivo, não apenas pela sua clara importância como recurso natural, mas, também, pela sua componente cultural e mística.
Por essa Serra acima andei, nos meus tempos de escuteiro, por montes e vales, embrenhado na profusa e, às vezes, quase impenetrável vegetação, respirando aquele ar insubstituível, misto de odores secretos e exóticos que emanam do seu manto florestal. Caminhei, vezes sem conta, por aqueles lugares de eleição, onde o Homem se reencontra com a sua própria natureza.
É um lugar único, irrepetível e inimitável. Está ali há tempos imemoriais, quase intocado, até há bem pouco tempo. A ocupação humana, a que quase nada escapa, rodeia-o e aperta-o num cerco, que só não fecha completamente, porque a sul faz fronteira com a imensidão do mar.
A geração a que pertenço cresceu, amadureceu, ganhou consciência crítica relativamente ao mundo e a todas as coisas que o compõem, numa altura em que a problemática ambiental começava a ser encarada com angústia. A humanidade despertava para uma realidade inquietante. A natureza reagia epidermicamente à acção predadora do Homem.
Movido por este súbito despertar, por esta inesperada ameaça a elementos tão fundamentais para a nossa sobrevivência, como o mar, os rios e as florestas, toda uma geração que se empenhou em lutar por este bem comum, que a desaparecer, arrastaria irremediavelmente consigo o causador da sua destruição: o Homem.
Em Setúbal, como noutros locais, surgiram movimentos espontâneos de defesa do ambiente: o Núcleo de Setúbal da Liga para a Protecção da Natureza, o Setúbal Verde, a Quercus… Antes, já despertas e alertadas as consciências para o perigo iminente que pendia sobre a nossa região, havia sido criado o guardião da Serra: o Parque Natural da Arrábida, entidade sobre quem recaiu a responsabilidade de zelar pela defesa e valorização daquele espaço natural.
A actividade de grupos ecologistas como o Setúbal Verde, fruto de tempos algo ingénuos, mas de uma pureza que nunca mais foi possível recuperar, foi, sem dúvida, determinante. Sem a componente política que os grupos ambientalistas hoje detêm; sem a força dos “lobbies” que agora se fazem sentir, o movimento ecologista do final dos anos setenta, do qual o Setúbal Verde fez, entre outros, parte, deu, na sua simplicidade, um forte impulso ao movimento ambientalista em Portugal.
Idealistas, virados para a procura de um modelo de sociedade onde o Homem e a Natureza pudessem coexistir pacificamente, sem, contudo, pôr em causa o desenvolvimento da sociedade, nem a aspiração humana de procurar continuamente adequar o espaço às suas necessidades vitais, os velhos movimentos ecologistas foram pioneiros de uma forma nova de olhar o mundo.
Hoje, muitos dos que viveram e deram forma às ideias e às lutas do passado, estão em lugares de decisão política e social. Assumem-se como protagonistas de decisões, pesando sobre eles o fardo difícil, e não poucas vezes incómodo, de gerir espaços que no passado lograram defender como cidadãos.
Pela primeira vez de cruzam, num mesmo olhar, antigos defensores de uma sociedade ambientalmente pura, e actuais gestores que perfilham de uma filosofia de sociedade obrigatoriamente mais prosaica, mais vocacionada para gerir o precário equilíbrio natural resultante da ocupação e actividade humana, mas nem por isso menos entusiasta e empenhada.
A esses homens, qua amam a Serra e o Rio e que, com a sua acção, têm vindo a preservar os espaços fundamentais da tentação predadora dos homens, eu deixo a minha sincera homenagem. O Rio e a Serra são bons conselheiros. Quem tenha tido o privilégio de respirar os aromas que deles emanam jamais poderá ficar indiferente à sua beleza e importância. Que o digam poetas e místicos que por lá passaram e se inspiraram para versos e prosas de grande humanidade, pureza e intensidade.
Ninguém sabe ao certo de quanto tempo dispõe o mundo em que vivemos: um milénio, um milhão de anos… Pouco importa, se a Arrábida continuar a ser para o Homem aquilo que sempre foi: um lenitivo para os sentidos, uma fonte inesgotável de inspiração poética e um lugar privilegiado para o encontro com a parte do sagrado que vai persistindo em nós.